quinta-feira, fevereiro 23, 2006

Sonho

223 anos desta não-vida nocturna e vazia. 223 anos de clantestinidade e esquecimento. 223 anos com um corpo jovem, mas com uma alma a envelhecer. Porque são mais de 200 anos de relações falhadas. Porque em terra de cegos, quem tem um olho sofre. Porque a diferença não é tolerada. Porque não se partilha uma não-vida. Porque sem partilha, não se vive.

O que mata um vampiro não é uma estaca no coração, é a solidão...

Spain - Dreaming of Love

segunda-feira, fevereiro 20, 2006

Desapontamento

Pegaste no facalhão das costeletas e cortaste o teu polegar esquerdo. Viraste-te para mim e gritaste possessa: "Que tal isto para prova de amor, hã?". Encolhi os ombros: "Preferia o Rolex daquela montra..."

domingo, fevereiro 19, 2006

A queda

Há algo em ti que me deixa inquisitivo. Há um lastro sentimental por baixo do teu olhar. Há uma existência que rejeitaste. Há um conhecimento profundo. Há uma dor profunda que transpira dos teus poros.
Então, revelas-me que a existência de anjo é dolorosa, solitária e monótona.

E trocaste-o pela experiência da vivência humana. Pela mortalidade, pelo suor, pela dor na primeira pessoa, pela esperança vã e vital.

Nick Cave & The Bad Seeds - What Can I Give You?

sexta-feira, fevereiro 17, 2006

Perdido

Mas que raio...? Mal consigo abrir os olhos, enquanto tento perscrutar o quarto onde me encontro. Não reconheço nada à minha volta. Olho para o relógio de ele diz-me que são 10h30, de um dia 14 qualquer. Pelo sol que entra pela janela, deve ser de manhã. Mas 14 de que mês? Não me consigo lembrar. Sinto na garganta um gosto ácido embora, de uma forma estranha, agradável. Sinto-me a flutuar até ter necessidade de fixar um ponto na parede, sob pena do enjôo se avolumar até um ponto crítico. Estou estendido em cima de lençóis brancos em desalinho. Olho para o outro lado e vejo um corpo de mulher que não reconheço. Dorme pacificamente. Não me lembro de nada do que se passou, mas sinto que está tudo bem. Fecho os olhos e volto a adormecer convicto que, quando os abrir de novo, os mistérios se desvanecerão...

Welcome to Tijuana
Tequila, sexo y marijuana...

Manu Chao - Welcome to Tijuana

quinta-feira, fevereiro 16, 2006

Insatisfação

De súbito, estaquei no passeio. O solo emanava um odor a chuva acabada de cair. A noite envolvia-me e os pingos de chuva tornavam-se pesados na minha cabeça. Sentia uma insatisfação a corroer-me as entranhas, uma sensação de vazio, uma inquietude. O meu cabelo começava a ficar empapado e, a pouco e pouco, gotas de água grossas começavam a percorrer a minha testa e a cair sobre os meus olhos. Olhei à minha volta, mas nada encontrei.

Sinto falta de algo, mas não consigo precisar de quê.

terça-feira, fevereiro 14, 2006

Lamento

Se alguém quer saber o que tenho a dizer? Claro que não. Deixaram-me aqui pregado na cruz, vai para dois mil anos. Que sou um Deus, dizem-me. Mas, quando tento abrir a boca, amordaçam-me prontamente. Dizem que lhes dou cabo do negócio. A minha marca vende mais que a Coca-Cola. Dizem-me que lhes desvalorizo os activos, se digo alguma coisa. Para deixar a gestão para quem percebe disso. Pregado na porra da cruz. Põem-me palavras na boca. Seleccionam as poucas que disse, fora de contexto, quando lhes convém. E aturo a porcaria das velhas devotas de mau hálito que me vêm dar beijinhos na imagem. Porcaria de vida. Melhor, de morte.

Nick Cave & The Bad Seeds - The Mercy Seat

Fim

Numa onda, a turba investe contra os portões. Cá dentro, aninho-me junto a um canto da sala, convenientemente afastado das janelas, por onde entram pedras de várias dimensões e pesos. Jamais se poderá saber a verdade sobre o que se passou cá dentro. A onda de histeria popular criou a sua história, da qual se alimentaram as televisões e os jornais. A verdade é um detalhe irrelevante. Quando a mentira se infiltra nas mentes pequenas, a verdade não poderá sobreviver. A minha criação já foi destruída, eles não saberiam o que fazer com ela. Aguarda-me o linchamento às mãos da mole de revoltados. Jamais poderão almejar chegar aonde cheguei. Jamais as suas vidas serão extraordinárias, tirando o momento em que se depararão comigo e me matarão. Não é a sua culpa. Eles não são livres. São manipulados e programados pelos sistemas de controlo e condicionamento que lhes foram impostos.

Penso em Byron, Shelley (de certo modo, a minha inspiração) e os outros na Villa Diodati - e as reacções populares ao que lá se passava - e percebo que a história não faz mais do que se repetir a si mesma. E que arte e ciência estão do mesmo lado da barricada.

Sonic Youth - Tom Violence

segunda-feira, fevereiro 13, 2006

Rejeição III

Eu pedi-te para não mo dizeres à minha frente, mas não quiseste saber.
Fiquei com um nó na garganta e senti-me perdido, a cair, a desfalecer. As minhas pernas trémulas de alguma maneira aguentaram-se. Dei meia volta, virando-te as costas. Tentei compôr o passo mais decidido e firme que consegui. Felizmente, quando as lágrimas saltaram dos meus olhos não as conseguiste ver.

The Cure - Boys Don't Cry

domingo, fevereiro 12, 2006

Dopamina

Os cientistas descobriram que a sensação de paixão é resultado da presença de algo chamado dopamina no nosso cérebro. Mais interessante ainda, concluiram que, nos casais com um ano de relação, a tal dopamina estava de volta aos valores normais. Em suma, concluíram não só que a paixão não dura para sempre, mas inclusivamente, que não chega a durar 12 meses.

Como corolário destas conclusões, proponho-me ao seguinte, com validade para todas as relações iniciadas a partir desta data:

- No primeiro ano de relação:
1) não casar.
2) não nos mudarmos para viver juntos.
3) não partilhar contas.
4) não comprar coisas "para a nossa futura casa".
5) NÃO TER FILHOS!

- Ao completar um ano de relação, reavaliar o seguinte:
1) se gosto assim tanto de todos os CD's comprados no último ano, sobretudo aqueles da "nossa banda favorita".
2) rever criticamente os filmes vistos no último ano. Mais do que isso, perceber se não deveria ter visto os que não vi.
3) olhar para a estante, ver os livros que li e reflectir se os teria lido se não estivesse com ela. Mais importante, terão valido a pena ou teria lido outros mais interessantes?
4) se aquela verruga é, de facto, encantadora.
5) se acho mesmo graça aquele feitio, ou se não será irritante?


Obrigado a todos os cientistas que realizam estes estudos. Sem eles, nunca saberia que, se uma relação com mais de 12 meses me fizer feliz, deve ser amor...

sábado, fevereiro 11, 2006

Olhar

Os meus olhos vagueavam a montra. De súbito, o brilho do seu reflexo confundiu-se com o dos teus, do outro lado, numa sobreposição perfeita.

Desde então, escrutino os olhares alheios avidamente, na esperança de te encontrar...

sexta-feira, fevereiro 10, 2006

Definição

Felicidade é o momento que precede aquele em que tudo começa a correr mal.
Desta forma, o segredo de um final feliz é apenas o timing...

quinta-feira, fevereiro 09, 2006

Anjos















Angels with silver wings
Shouldn't know suffering

Depeche Mode - Precious

Depeche Mode











































quarta-feira, fevereiro 08, 2006

Pensamento lunático da noite

Cada tacho tem a sua tampa.

E depois há as frigideiras...

Caça

E então, o detective vislumbrou, num relance, tudo o que estava a acontecer: todas aquelas pistas espalhadas aqui e ali e os acasos felizes... não eram obra de descuido nem tinham sido ligadas pelos seus poderes dedutivos. Tinham sido colocadas para que ele estivesse ali, naquele momento.

Percebeu que não era o caçador, mas sim a presa.

segunda-feira, fevereiro 06, 2006

Mapa

Procuro debaixo das pedrinhas. Quando vejo terra remexida, tento ver o que estará lá enterrado. Utilizo todos os motores de busca na Internet. Concentro-me, medito e tento visualizá-lo. Pergunto nos meandros dos informadores anónimos.

Tento encontrar o mapa para o teu coração.

Abraço

Queria-te mesmo dar um abraço. Presumo que não precises dele, mas eu estou mesmo a precisar de to dar.

domingo, fevereiro 05, 2006

Lua

I feel far away from you
So what else is new?
The moon is closer to the sun
Than I am to anyone

Nada Surf - 80 windows

Frustração

O que significa quando os sonhos que temos à noite são muito mais desinteressantes do que os diurnos? Isto começa a preocupar-me...

Cortés

Pronto. Hoje é noite de Joaquin Cortés no Coliseu. Continuo convencido que, para muitas mulheres, é das experiências mais próximas a strip-tease masculino a que se permitem. O entusiasmo é indesmentível. A intensa actividade hormonal também. Claro que se as confrontamos com isso, a resposta é óbvia: nãããã... a arte, o bailado...
Pois, pois, também a Playboy tem artigos muito interessantes... ou não acreditam que é por isso que há quem a compre?

Momento

Depois de te ter dito que não tinha a certeza acerca do que sentia por ti, repondeste-me que o melhor era acabarmos. E acrescentaste: "Era contigo que eu queria casar e ter filhos". Nesse momento, percebi que não há borracha que apague certos disparates. Que nunca tive maturidade para forçar a nossa relação tão longe. Que nunca te mereci.

E hoje, baixo os olhos quando algo me lembra de ti.

Nouvelle Vague - In a manner of speaking

sábado, fevereiro 04, 2006

Atenção

O iPod hoje está muito mais bem disposto. E certeiro. O shuffle está-me a presentear com as músicas ideiais. Quando o vi ontem quase a desfalecer com falta de carga, percebi porque andava zangado comigo. Alimentei-o longamente. Agora sim, estamos amigos de novo.

Sexo fraco

Estamos em guerra. De sexos. Há dias, uma amiga perguntava-me porque nós (homens) somos tão mentirosos, mostrando-nos interessados por alguém e depois descartando-a por outra. Mesmo ao telefone, eu encolhi os ombros. Isso parece-me uma análise deturpada. As mulheres sabem o poder que têm sobre nós. E usam-no. Sabem que, no fundo, somos todos uns papalvos que não resistem a um olhar meigo. Ou a uma mulher inteligente. Ou a uma mulher com sentido de humor. Têm a faca e o queijo na mão. Uma mulher passa, normalmente, uma quantidade de tempo muito mais substancial que um homem a valorizar o seu aspecto. Umas envergam pinturas de guerra para sublinhar os seus traços mais interessantes. Outras sabem-se irrestíveis pelo seu ar natural e adolescente. Outras sabem-se capaz de ter a punchline certa para cada momento. E aplicam esse saber para quê? Para nos manipular. Para obter de nós aquilo que pretendem. Para nos reduzir ao estado imbecil. Para nos terem pelo beicinho. Para lhes carregarmos os pesos. Para lhes trocarmos os pneus furados. Para nos arrancarem o coração e colocarem-no junto aos outros na sua estante de troféus de caça.

E nós no meio disto? Todos os dias olhares, sorrisos, piadas provocadoras, teasing... claro que carregamos pesos, trocamos pneus, ficamos imbecis, pelo beicinho, entregamos corações de mão beijada. Somos o sexo fraco. A nossa única única liberdade é longe delas.

P.S. Que tal isto para ressabiamento, Daniela?

Ameaçado

Hoje o mundo está estranho.
As coisas parecem fora de sítio. O meu quarto assumiu vida própria e encontro coisas que não sei o que estão cá a fazer. Talvez eu tenha passado demasiado tempo a ver televisão (não pode ser bom). Os quadros não olham para mim. O candeeiro está-me a torturar com um foco nos olhos. Num dos cantos, a pilha de jornais está a crescer e a ameaçar-me. Há um livro chamado "Haunted" na minha mesinha de cabeceira.

Quero abraçar-te.

Tindersticks - El Diablo en el Ojo

sexta-feira, fevereiro 03, 2006

Normal

Antes, tinhas os teus medos. Inseguranças. Humores. Paixões. Impulsos. Raivas. Choros. Frustações. Trocavas de perfume conforme o humor. Penteavas-te. Despenteavas-te. Dias em que conquistavas o Mundo, dias em que te sentias miserável.

Agora, vives uma vida confortavelmente plana. Confortavelmente equilibrada. Confortavelmente ignorante. Que não é a tua.

Take one, to come
Doctor's orders, no more borders
Take one, make some
Feeling bolder, no more disorder

Mother's not to blame
She's feeling no pain
Doesn't feel the drain
She says it's not her brain

All right, no wrong
She used to be cleanin', now she's just dreamin'
She's right, you're wrong
She thinks it's the weather, feels light as a feather

Mother's such a mess
She forgets how to dress
She thinks she's lookin' her best
She's no longer depressed

Take one, bake one
Used to be tragic, now it's like magic
Just one, for fun
Mother's new pet, it's not hard to get

Mother came home today
Wearing a big bouquet
She threw her self away
She's taking up spanish ole

Sonic Youth - Doctor's Orders

Para o Rui

O amor é um lugar estranho (plágio), onde muitas vezes estamos sozinhos e outras temos a sorte de encontrar alguém especial.

Air - Alone In Kyoto

Rendo-me...

And I don't believe in the existence of Angels
But looking at you, I wonder if that's true

Nick Cave and the Bad Seeds - Into My Arms

Mais ressentimento...

Achei que eras a mulher da minha vida. Até ao momento que percebi que, talvez fosses, mas não desta...

quinta-feira, fevereiro 02, 2006

Direito de resposta

Fui alvo de uma provocação que não deixo sem resposta. A daniela sugeriu num comentário ao post "A revelação" que eu posso estar ressentido com as mulheres.
Reli o que tenho escrito. Terei sido cínico a falar de relações humanas? Algumas vezes, com certeza. Mas noutras, falei de paixão, de insegurança, de perda. Falei de experiências em que acabo magoado, experiências em que magoei alguém e em paixões que podem ter sido eternas antes de se extinguirem.
Ressentimentos não os tenho. Tenho nostalgia de coisas que vivi e perdi. E lamento que possa haver quem tenha ressentimentos de mim. Talvez merecessem ser amadas mais do que eu consegui amar.


Mas acredito que um dia vou citar António Lobo Antunes e dizer a alguém "Gosto tudo de ti" e que será uma bela história sem fim e que talvez, nesse dia, o meu blog se torne um pouco menos cínico... :-p

Red Hot Chili Peppers - Road Trippin'

Agradecimento

Ao completar-se uma semana do nascimento deste blog, quero agradecer todo o feedback que em tão pouco tempo recebi. Já houve quem quissese adivinhar quem era a personagem de determinado post, quem se sentisse atingida por coisas que escrevi, quem achasse que eu estava a precisar de terapia... fico contente com isso, mas repito: as pequenas histórias que escrevi e que envolvem uma ela são ficçõezinhas, apenas isso. Claro que quem me conhece bem e carrega a cruz de ter de aturar boa parte das histórias da minha vida, pode perceber quem é a musa inspiradora (ou as musas..) por detrás de cada uma delas...

Muito obrigado por todas as vossas reacções, boas, más e assim-assim ;-)

Fidelidade

Decidi revelar-te o motivo da minha partida. Não que me sentisse mal contigo, longe disso. E sabes que te acho uma pessoa e interessante e divertida. A verdade é que, quando me tentaste impingir os teus instrumentos de manicure, percebi que nunca daria certo. Não por orgulho macho, que até nem tenho nada contra ter as unhas arranjadas. Mas a verdade é que tenho uma relação estável de mais de 10 anos com o meu corta-unhas. E nunca conseguiria ser-lhe infiel.

quarta-feira, fevereiro 01, 2006

Recuperação

Vieste-me atender à porta com aquele ar de "mas o que fazes aqui?". Disse-te olá. "Quero o meu coração de volta... o meu psicólogo diz que não posso viver mais assim". Dirigiste-te à cozinha, abriste o congelador, começaste a remexer entre os sacos lá dentro. Viraste-te subitamente para mim com um ar comprometido. "Sabes... já começava a cheirar mal... tive de o deitar fora há umas semanas...". Senti-me empalidecer. "E o que faço agora? Cada vez me sinto mais fraco...". Desesperei e tu também, face à urgência da situação. Finalmente , disseste "O que tenho aqui de mais fresquinho são umas tripas, estava a pensar cozinhar umas à moda do Porto este fim de semana". Encolhi os ombros, resignado "Se é o que tens...".

Lá tive de fazer das tripas coração.

The Cure - Anymore Than This

Inútil

Estou a preparar várias listas: uma de insultos, uma com piadas, outra com provérbios zen, uma de elogios descomprometidos e outra de citações famosas.

Não há nada mais inútil do que encontrar a resposta ideal tarde demais...